Por Jorge Rocha
“(...) A nossa sociedade, convulsiva e mutável, não me parece caminhar no sentido de mais egoísmo(...) Se portanto, vamos no sentido de mais convívio, mais humanidade, é muito provável que vamos também para uma maior abertura ao outro, talvez diferente de si, mas do qual não se pode ignorar nem rejeitar a diferença”. (Simon, 1991)
A Declaração Universal dos Direitos Humanos é inegavelmente um marco de referência para o posicionamento do ser humano no Mundo, na sua dimensão individual e social. Proclamando os direitos do Homem e as suas liberdades fundamentais, a dignidade e valor da pessoa humana, justiça social e paz, serviu de base a outras convenções, acordos e instrumentos internacionais que imprimiram um cariz específico aos princípios consignados na Declaração, destacando-se as “ Normas sobre a Igualdade de Oportunidades para as Pessoas com Deficiência”. Nações Unidas(1994)
Produto de particular atenção por parte das Nações Unidas e de outras organizações internacionais e nacionais, as Normas colocam a tónica na dimensão sócio-ética, assente em argumentos humanistas que defendem a igualdade de oportunidades e os direitos das pessoas com deficiência, exaltando-se a importância da participação, poder de decisão e escolha dessas pessoas no que concerne a actividades e papéis inerentes a áreas decisivas da qualidade de vida, nomeadamente a Acessibilidade, Educação, Emprego, Vida Familiar e Dignidade pessoal, Cultura, etc.
Contudo, não faz qualquer sentido falarmos destas dimensões da qualidade de vida da pessoa portadora de deficiência mental quando, ao mesmo tempo, se lhe é vedado o direito à sua sexualidade e afectividade. Se pensarmos que a sexualidade se revela, segundo a Organização Mundial de Saúde, como “(...) uma energia que nos motiva para encontrar amor, contacto, ternura e intimidade; ela integra-se no modo como nos sentimos, movemos, tocamos e somos tocados; é ser-se sensual e ao mesmo tempo ser-se sexual. A sexualidade influencia pensamentos, sentimentos, acções e interacções e, por isso, influencia também a nossa saúde física e mental”, facilmente percebemos que é através dela que passa toda a experiência e auto-consciência de um indivíduo: a pessoa percebe, sente, pensa e deseja. López e Fuertes (1999, p.7) referem a esse propósito que “ (...) o Homem é um ser sexuado; a sexualidade mediatiza todo o nosso ser.” Neste sentido, toda a problemática da sexualidade remete-nos, inevitavelmente, para o desenvolvimento humano e para a própria complexidade que o caracteriza. Sendo a sexualidade uma dimensão da personalidade, não se pode negar à pessoa portadora de deficiência mental a liberdade de viver e expressar a sua sexualidade. Entenda-se que ao falarmos de sexualidade estamos a falar de uma realidade que não se esgota no acto sexual. Ela é também e ,sobretudo, amizade, carinho e relacionamento pessoal. Possuir amigos, partilhar interesses, relacionar-se e experimentar sentimentos de união são algumas das necessidades mais profundas de todo o ser humano. A pessoa portadora de deficiência mental deve aprender desde logo a reconhecer a sua individualidade, compreender o comportamento social e o seu comportamento como membro de uma sociedade, conhecer a sua própria vulnerabilidade e, essencialmente, saber escolher, decidir e desenvolver a sua própria sexualidade.
Sendo assim, deparamo-nos com um grande desafio: garantir a normalização da vida afectivo-sexual dessa população.
Conseguirá a nossa sociedade responder a este desafio?
Ao caminharmos num sentido mais humanista - reconhecido nos movimentos actuais de índole social, educacional, psicológico e legislativo – seria contraditório e inconcebível que não se respeitasse e reconhecesse o direito à sexualidade e à educação sexual daqueles que são “diferentes”.
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