quarta-feira, 25 de fevereiro de 2009

É Carnaval, mas temos que levar a mal.

Na senda da denúncia do que está mal, tenho que protestar contra a organização do Carnaval de Alhandra.
Fi-lo prontamente no local e fá-lo-ei aqui publicamente.
Lá por ter sído organizado por voluntários que se esforçaram por pôr de pé uma tradição antiga da vila de Alhandra, não quer dizer que não apontemos o que está mal. Como o meu pai sempre disse, o voluntariado e o amadorismo acarretam responsabilidades.
Acontece que, eu, como antiga moradora daquela bonita vila à beira rio, peguei nos meus filhos e fui visitar os meus pais e brincar ao Carnaval. Até aqui tudo bem. Mas quando decidi ontem, terça-feira, ir tomar café com as minhas cunhadas e a minha filha, qual não foi o meu espanto quando fui impedida de sair na Travessa do mercado porque a minha cadeira de rodas NÃO CABIA na entrada deixada livre para acesso à zona do desfile ( que por acaso é mesmo onde os meus pais moram).
Não havendo qualquer indicação de alternativa àquela passagem com um aviso ou um distico indicativo de alternativa, protestei, claro. Afirmei que tinha o direito de passar e que o queria fazer. Embora tivessem vedado o acesso à rua Dona Maria Annes e ruas circundantes para poderem angariar fundos para futuras iniciativas, deveriam ter em consideração as pessoas em cadeira de rodas. Afinal, também temos o direito de nos divertirmos, de visitar familiares, de fazer uma vida "normal". Foi-me respondido que, embora eu tivesse razão, tinham-se esquecido deste " pormenor". E não podiam mover as barreiras.
Tenho que referir que a alternativa foi a entrada das viaturas do corso, que ficava bastante longe para quem como eu tem que "andar" de uma forma diferente.
Foi-me prometido, à laia de desculpa, que para o anos, contrariamente a este ano, que se limitaram a medir a largura das cadeiras de bébés( e deviam ser das mais pequenas), tomariam em consideração as cadeiras de rodas.
Até lá esperarei para ver. Sentada...

terça-feira, 24 de fevereiro de 2009

O meu Pai












Alguém me perguntou uma vez se eu tinha um ídolo. Naquela altura, à muitos anos, fiquei a pensar. Hoje, inubitavelmente vos digo que sim, que tenho.
O meu pai.
Porquê hoje? E porque não?!
Não tenho palavras que descrevam o afecto, o apreço que nutro por este homem. Um homem humilde, sonhador, sensível, um homem de afectos.
Ele foi e é a minha "muleta", o meu porto seguro na tempestade, a minha rosa-dos-ventos.

Desde que entrei nesta nova etapa da minha vida que conto com o apoio inequívoco de dois homens... o meu marido e o meu pai.
O meu pai tem sído incansável no apoio que tem dado à minha família, tanto no plano afectivo como no plano prático, pois é a ele que recorro frequentemente para me deslocar, ou até para o transporte dos meus filhos. Mas não é isto que quero dizer. Quem conhece bem Gutemberg Ralha não se espanta com estas atitudes.
Quero falar-vos do meu ídolo.

Começou muito novo, com 11 anos a trabalhar, para ajudar a sustentar a família. Descalço, pintava quilhas dos barcos no rio em Alhandra. Trabalhou em muitas coisas, foi merceeiro, fez desporto, entrou para a antiga Cimento tejo, foi à tropa, aproveitou a oportunidade que lhe deram na empresa e , em busca de uma vida melhor para si e para os seus voltou a estudar. Fez a antiga escola industrial, a admissão ao liceu e foi estudar engenharia. Com muito esforço, sacrifício, sem descurar a sua família. É certo que mal o víamos, que a minha mãe segurou as pontas, que o meu pai se estafava a trabalhar na fábrica e que, muitas vezes, com apenas uma pequena bucha, lá apanhava o comboio para Lisboa.
Pai de três filhos, foi com muito suor e muitas lágrimas que acabou o curso.

Nunca perdeu de vista a sua paixão, a música. Executante de clarinete desde os 12 anos na banda da Sociedade Euterpe Alhandrense, arranjou sempre tempo para conciliar as suas obrigações. Sim, porque como ele me ensinou, ser amador também acarreta responsabilidades. Mesmo cansado ou abatido, lá segue para o ensaio da banda com um sorriso nos lábios, como nos primeiros tempos. Pelo caminho dirigiu e dirige grupos corais. Sempre com humildade, não gosta de ser chamado nem de engenheiro nem de maestro. Nunca o vi de fato e gravata a não ser quando a ocasião o exige. Na fábrica, mesmo depois de ter acabado o curso, usava fato de macaco e era tratado por Guta ou Tibé.

Ensinou-nos que todos os homens são iguais e que o Dr ou o Eng. não vem no bilhete de identidade. Ensinou-nos que na vida vale a pena lutarmos por aquilo em que acreditamos.

Nunca o vi abatido ou derrotado, embora saiba que já se tenha sentido assim tantas vezes...
Este Homem faz 72 anos dia 27 de Fevereiro. E continua a dar tudo o que tem aos outros, sem nunca pedir ou exigir nada em troca.
Obrigada, pai, por tudo o que me tens dado. Obrigada por tudo o que me ensinaste.
Desculpa se a vida mais uma vez te trocou as voltas e se continuo a precisar de ti, agora que devias viver finalmente tranquilo, sem sobressaltos. Gostava que tudo fosse diferente. Não é.
Pelo menos tenho-te a ti.
Esta é a minha singela homenagem, sentida e chorada, ao Homem da minha vida

quinta-feira, 19 de fevereiro de 2009

As barreiras emocionais

Muitas vezes as pessoas ditas "normais" pensam e acham que apenas as barreiras físicas são impeditivas para os deficientes. Infelizmente essa não é a verdade.
Falemos então das barreiras para as quais não há legislação aplicável. Quais são? As barreiras emocionais.
Por barreiras emocionais entendo as barreiras psicológicas, aquelas que descriminam, as que humilham, as que silenciam. As barreiras criadas pela discriminação. As barreiras sociais. As que sentimos cada vez que somos olhados de lado, cada vez que nos humilham porque somos "diferentes".
Ou cada vez que nos tratam como "coitadinhos".
Ou cada vez que somos gozados na rua. Dizia um dos leitores deste blog que sofre de uma incapacidade visual que é alvo de chacota por parte de alguns jovens cada vez que vai na rua. Este particular comportamento também acontece com os idosos, infelizmente. Não há uma educação cultural que permita encarar o outro como um ser igual. É ignóbil. Mas infelizmente não são só os jovens que o fazem.
O mesmo acontece nos supermercados em que existe uma caixa própria para deficientes, e no caso dos deficientes motores é essencial, não porque permite "passar à frente" mas porque é a única que tem largura suficiente para a cadeira de rodas passar. E o que acontece? Está sempre ocupada ou fechada. E no meu caso, sempre que me perguntam porque não me dirijo à caixa prioritária, respondo sempre o mesmo, já fui suficientemente humilhada por clientes"normais" que ficam demasiado incomodados por serem chamados à atenção para querer passar por isso mais uma vez.
E as casas de banho? As de deficientes ou estão fechadas ou normalmente ocupadas por quem não necessita delas. E para nós que não controlamos as necessidades fisiológicas basta por vezes um instante para que fiquemos num estado em que nos sentimos de facto humilhados e vencidos...
As filas nas entidades publicas, os balcões altos, a inacessibilidade às prateleiras dos supermercados, a falta de civismo por parte do publico, todos estes factores acabam por ser desmotivadores para quem de facto tem dificuldades acrescidas na vivência do dia-a-dia.
E o que dizer ao isolamento social, ao estigma, à solidão? Quantos de nós nos preocupamos com os amigos ou conhecidos que vivem isolados e presos na sua clausura, não por iniciativa própria mas porque não têm condições para sair?
Não sejam solidários só no Natal...
Sejam-no todos os dias e olhem um bocadinho para o lado. Só um minuto. É o bastante para fazer a diferença.

terça-feira, 17 de fevereiro de 2009



Esta de facto é uma verdade de La Palisse...palavras para quê?
A lei está lá, mas não se cumpre...
A fiscalização é deficiente visual, as Câmaras deficientes auditivos...Como vêm, afinal nós não somos os diferentes...
Esta devia de ser a sinalética existente...Podia ser que assim se pudesse estacionar, quem sabe...

segunda-feira, 16 de fevereiro de 2009

Benefícios fiscais

Os multibancos e a legislação.

O que diz o especialista sobre as normas dos Multibancos:

"Caixas Multibanco na Via Pública

Uma caixa Multibanco aberta para a via pública tem de cumprir as normas do DL 163/2006?
Sim.
O DL 163/2006 abrange as caixas Multibanco. No seu artigo 2.º (âmbito de aplicação), n.º 2, alínea h), refere os “bancos e respectivas caixas Multibanco”.


No exterior também?

Note-se que não é feita, no âmbito de aplicação, nenhuma distinção entre as caixas Multibanco operáveis a partir do interior do edifício, ou do seu exterior. Deve presumir-se, por isso, que ambas estão abrangidas.

O facto de a secção 2.11 (onde se estabelecem as exigências relativas aos equipamentos de auto-atendimento) estar integrada no capítulo 2 (edifícios e estabelecimentos em geral) não torna estas normas menos aplicáveis a uma caixa Multibanco operável a partir da via pública.

Basta notar que estes equipamentos estão instalados em edifícios, e que as normas não distinguem entre equipamentos operáveis a partir do interior ou do exterior do edifício.


Só nos bancos?

A dúvida seguinte é suscitada pelo uso da expressão “bancos e respectivas caixas”.

Deve depreender-se que só as caixas localizadas em agências bancárias é que estão abrangidas, ou pelo contrário devem considerar-se abrangidas todas as caixas, independentemente da sua localização?

Por exemplo, as caixas Multibanco existentes nas instalações de uma companhia de seguros, também devem ser acessíveis?

Nada indica que o legislador pretendesse limitar aos bancos essa obrigação. Deve referir-se, a este propósito, o disposto na Lei n.º 46/2006, que classifica como práticas discriminatórias “a recusa de fornecimento ou o impedimento de fruição de bens e serviços” e “o impedimento ou a limitação ao acesso e exercício normal de uma actividade económica” (cf. artigo 4.º, alíneas a) e b) da referida lei).

A expressão “bancos e respectivas caixas” pode (e deve), nesses termos, ser entendida num sentido mais abrangente, i.e., como integrando os bancos e os equipamentos através dos quais os seus serviços são prestados, independentemente de estes se encontrarem instalados no espaço físico da agência bancária ou noutros espaços físicos.

Deve entender-se, por isso, que não são apenas as caixas localizadas em agências bancárias que estão abrangidas, mas todas as caixas Multibanco instaladas em edifícios.


Que normas se aplicam?

As caixas Multibanco são consideradas “equipamentos de auto-atendimento”. As exigências aplicáveis constam da Secção 2.11 das normas técnicas do DL 163/2006.

Nos termos do n.º 2.11.1, “nos locais em que forem previstos equipamentos de auto-atendimento, pelo menos um equipamento para cada tipo de serviço” deve cumprir essas exigências.

Por outras palavras, nos locais onde houver mais de uma caixa Multibanco, o exigível é que pelo menos uma cumpra as normas.

Nenhuma dessas normas, note-se, é incompatível com a abertura da caixa Multibanco para a via pública.

Exige-se, por exemplo, que o equipamento esteja localizado junto a um percurso acessível (cf. alínea 1) do n.º 2.11.1), mas este pode, naturalmente, coincidir com a via pública.

E o mesmo se pode dizer sobre a zona de permanência (cf. alínea 2) do n.º 2.11.1).

Se num determinado edifício houver, na mesma zona, duas ou mais caixas Multibanco, e se estas estiverem distribuídas pelo interior e pelo exterior, a exigência aplica-se ao conjunto dos equipamentos disponíveis, e pode optar-se por assegurar a acessibilidade a qualquer um deles.

Se porventura o equipamento acessível se localizar no interior, deve assegurar-se que ele pode ser alcançado a partir da via pública por um percurso acessível, e deve atender-se ao cumprimento das normas aplicáveis à soleira, à porta (largura útil, zona de manobra, puxador) e a todas as partes operáveis (por exemplo, a ranhura para passar o cartão e aceder ao interior deve estar dentro da zona de alcance). E não se pode sujeitar a sua utilização a um regime horário diferente dos restantes equipamentos localizados na mesma zona."

Esta explicação é feita por Pedro Homem Gouveia no seu Blog Acessibilidade-Portugal.bolgspot.com
No entanto, e em virtude do desconhecimento geral, coloco aqui os excertos da lei referidos no artigo.
Diz assim o Decreto -lei 163/2006 no artigo 2º ( âmbito de aplicação ):

Âmbito de aplicação1—As normas técnicas sobre acessibilidades aplicam-se às instalações e respectivos espaços circundantes da administração pública central, regional e local, bem como dos institutos públicos que revistam a natureza de serviços personalizados ou de fundos públicos.

2—As normas técnicas aplicam-se também aos seguintes edifícios, estabelecimentos e equipamentos de utilização pública e via pública:
a) Passeios e outros percursos pedonais pavimentados;
b) Espaços de estacionamento marginal à via pública ou em parques de estacionamento público;
c) Equipamentos sociais de apoio a pessoas idosas e ou com deficiência, designadamente lares, residências, centros de dia, centros de convívio, centros de emprego protegido, centros de actividades ocupacionais e outros equipamentos equivalentes;
d) Centros de saúde, centros de enfermagem, centros de diagnóstico, hospitais, maternidades, clínicas, postos médicos em geral, centros de reabilitação, consultórios médicos, farmácias e estâncias termais;
e) Estabelecimentos de educação pré-escolar e de ensino básico, secundário e superior, centros de formação, residenciais e cantinas;
f) Estações ferroviárias e de metropolitano, centrais de camionagem,
7) As teclas devem ser identificadas com referênciagares marítimas e fluviais, aerogares de aeroportos e aeródromos, paragens dos transportes colectivos na via pública, postos de abastecimento de combustível e áreas de serviço;
g) Passagens de peões desniveladas, aéreas ou subterrâneas, para travessia de vias férreas, vias rápidas e auto-estradas;
h) Estações de correios, estabelecimentos de telecomunicações, bancos e respectivas caixas multibanco,companhias de seguros e estabelecimentos similares;
i) Parques de estacionamento de veículos automóveis;
j) Instalações sanitárias de acesso público
E ainda, sobre as características que devem de ter os multibancos:
Secção 2.11—Equipamentos de auto-atendimento:


2.11.1—Nos locais em que forem previstos equipamento sde auto-atendimento, pelo menos um equipamento para cada tipo de serviço deve satisfazer as seguintes condições:
1) Deve estar localizado junto a um percurso acessível;

2) Deve existir uma zona livre que permita a aproximação frontal ou lateral de acordo com o especificado na secção 4.1;

3) Se a aproximação ao equipamento de auto-atendimento for frontal, deve existir um espaço livre com uma altura do piso não inferior a 0,7 m e uma profundidade não inferior a 0,3 m;

4) Os comandos e controlos devem estar localizados a uma altura do piso compreendida entre 0,8 m e 1,2 m, e a uma distância da face frontal externa do equipamento não superior a 0,3 m;

5) Os dispositivos para inserção e retirada de produtos devem estar localizados a uma altura do piso compreendida entre 0,4 m e 1,2 m e a uma distância da face frontal externa do equipamento não superior a 0,3 m;

6) As teclas numéricas devem seguir o mesmo arranjo do teclado, com a tecla do n.o 1 no canto superior esquerdo e a tecla do n.o 5 no meio;

7) As teclas devem ser identificadas com referência táctil (exemplos: em alto-relevo ou braille)."
A lei está aqui... foi aprovada e deve ser cumprida.
Mas não é.
O meu comentário é muito simples...
Multibanco fora do banco, multibanco dentro, multibanco nos centros comerciais, nos hipermercados...enfim, dentro ou fora, continuamos, nós, os que vemos e vivemos a vida sentados, a não conseguir utilizá-los. Não têm um rebordo que permita " estacionar" a cadeira lá de baixo, por forma a estarmos virados de frente para os mesmos, e os que fazem uma tentativa têm todos o teclado demasiado alto ou as ranhuras perfeitamente inacessíveis, o que torna uma ída ao multibanco num enorme exercício de equilibrio e de bom humor, visto da última vez que tentei fazer uma operação na caixa multibanco ter dado um valente trambolhão, tendo que recorrer à boa vontade dos traseuntes que passavam naquela altura para voltar para a cadeira.
Infelizmente, como sempre, o legislador legisla, mas ninguém aplica.
Não existe vontade política para fazer aplicar o legislado...
Para quando uma fiscalização efectiva aos edificios e entidades?

sexta-feira, 13 de fevereiro de 2009

Escrito a 20.07.2005

Relembro que este texto data de 2005, mas o facto de ter quase 4 anos não lhe tira o sentido...apenas estou mais serena ( às vezes...).


São 04.15 da manhã e mais uma vez não durmo. Começa a tornar-se um hábito na minha vida. A cabeça não pára. É assim quase desde o acidente. Aquilo que eu não digo de dia, penso de noite. Quando leio o que escrevi numas páginas atrás, um mês antes do acidente( poderei antes dizer, da minha morte, da morte do que eu era, do que sempre fui)não me reconheço. Quem era aquela pessoa insatisfeita com a vida, incapaz de parar, sem saber como lidar com as confusões do dia-a-dia? E quem sou eu agora? No que me tornei? Num pássaro sem asas?

No entanto, curiosamente, atingi uma certa paz. E já gosto de mim.

"Senhor dai-me forças para aceitar aquilo que não posso mudar"-passou a ser a máxima da minha vida. Não faz mal não conseguir andar desde que continue a ser eu, a se amada, a ser Mulher. É mais um começo, digo eu. Um renascimento. A fénix renascida das cinzas...

Mas à noite é tão difícil. No escuro, na solidão, no silêncio, as vozes na minha cabeça não param. As memórias do dia, o medo, a solidão, tudo me assola.

Vou procurar novo médico? Mais uma desilusão? Terei coragem? DEIXEM-ME!!

Sou eu que não ando, fui eu que morri!

Só quero renascer em paz. Deixem-me ter paz.

Comecei a gostar do silêncio. É reconfortante. É como o útero materno, um calor doce que nos protege e envolve. Também a solidão é doce. MAS MATA!! A INDIFERENÇA MATA!!

Será por isso que tanta coisa em mim morreu? Quem sou eu, agora? Porque me faço forte e tenho tanto medo de que pensem que sou piegas? Porque não consigo abrir a boca e expelir este grito surdo que me sufoca? EU MORRI!!! E agora quem sou eu?

Não preciso ir ao fundo de mim para ter força, para lutar. É inato. Não vergarei!

No entanto...será que se eu fechar os olhos consigo dormir? Queria tanto dormir! Será que quando eu acordar o pesadelo acabou?

ÀS vezes acho que começo a sentir qualquer coisa, mas depois vejo que não é verdade. Porque me engana a minha cabeça? Para depois me entristecer ainda mais? Será que se eu cortar uma perna sinto? Já pensei nisso, pegar numa faca e dar um golpe...Que estupidez! Afinal, gosto tanto de viver. Descobri-o quando morri.

Mas que futuro é que esta pessoa terá agora? Como vou fazer o que gosto? Tenho saudades de dançar, dançar até cair.

De saltar, de correr, sim, tenho saudades de correr. E de andar. E de rebolar na relva. E de nadar. E de andar de mão dada com o meu amor.

Oh Rui, se tu soubesses...se tu soubesses que já morri uma vez, mas que esta outra é diferente, tão diferente... Será que amas aquilo que sou agora?

A minha calma , a minha serenidade e o meu desespero. Olha, não te consigo dizer, como posso te dizer que já morri? E que sou um fantasma do que era?

Mas ao mesmo tempo renasci outra mulher. A voz é a minha, o rosto, o muro, as defesas, mas eu, o outro eu, já morreu. Ficou com os sonhos.

Esta outra já não sonha. Nem dorme. Vive no limbo, qual morta-viva, a quem se esqueceram de avisar que já morreu. Se calhar a paz é essa. A calma é essa. Estou morta e ainda não percebi...

Mas todos os dias visto o "fato" e subo ao palco. " The show must go on". Ri, palhaço...

" Mais triste que o teu sorriso triste é a tristeza de não saber sorrir"...quem foi o hipócrita que escreveu isto, que nos obriga a ficar com um ar de quem acabou de fazer uma cirurgia plástica de 3ª categoria? Assim com a cara meio pateta, com a boca repuxada...

Estou vazia de conteúdo e ideias. Só penso no exame médico, nos que ainda faltam fazer, no que é preciso pedir ao médico, em como vou voltar a fazer fisioterapia.

Céus, como é fútil agora a minha vida! Ou era antes?

Gostava de pensar em gastar dinheiro ( que não tenho, mas enfim...), em jóias, em roupa, em dietas, em maquilhagens, em futilidades...

Mas penso em médicos, em exames de diagnóstico, em fisioterapia, em processos judiciais, no que falta fazer.

Nunca sonhei com o acidente. Nem me lembro já bem como foi. Ou não me quero lembrar...Se calhar não nos lembramos de como morremos.

Deve ser do sono! Só penso disparates! Claro que me lembro. De tudo!

"Senhor, dai-me serenidade para aceitar aquilo que não posso mudar". É o meu novo lema. Ajuda. Aceito tudo.

Até quando?

Princípios orientadores deste blog

Hoje acordei, aliás mal dormi, com uma necessidade brutal de escrever. Não se trata de uma manifestação narcísica da minha pessoa ( passo a redundância) mas de uma necessidade terapêutica...é, descobri que a escrita de facto é terapêutica, lava-nos a alma( ai que isto durante a noite martelava-me melhor na cabeça, agora quase não me lembro).
De facto, percebi que tenho que dar uma orientação a este blog, não posso continuar a lançar desabafos, sem explicar para que de facto o criei.
Não é mais do que um espaço onde me permito dizer o que de outra forma não consigo ou não tenho espaço para o fazer.
Servirá ainda o propósito da denúncia...das más acessibilidades, da falta de apoios...para tal conto com o contributo de quem o lê, para que me auxilie a enriquecê-lo com situações concretas...
E ainda tem o objectivo de dar a conhecer como é de facto o dia-a-dia de um paraplégico, ou desta paraplégica, porque não tenho a veleidade de falar pelos outros.
E pronto, já enunciei os princípios orientadores deste blog. Se concordas com eles, continua por cá.

quinta-feira, 12 de fevereiro de 2009

Blogger Pictures
Vou abrir mais uma vez o meu coração. Hoje não estou bem. Nem todos os dias são dias.
Mas hoje de facto não é um bom dia. Até já caí... Por acaso é coisa que me acontece muitas vezes, mas hoje, para chatear, caí. Foi uma estupidez...Estiquei-me para chegar a um sítio, fiz pressão na ponta da cadeira e ela virou-se... Sou mesmo loira...então esquecí-me das leis da Física? Pois foi, olha, paciência...A minha cervical é que pagou, levou com a cadeira de rodas em cima...
Para me irritar ainda mais! devia ter juízo, estou farta de o dizer a mim própria, mas é tão complicado fazer as coisas sentada! E eu estou tão cansada de ter de as fazer...
Mas adiante, não sou rica, não tenho criados, tenho 2 filhos e 2 enteados e um marido que se esmifra para conseguir trazer algum dinheiro para casa...
Mas hoje não estou bem, talvez por isso tenha alterado o esquema da minha página de blog. UM FAROL. Isso é que eu preciso. De um farol que me guie nesta noite escura que atravesso. Não me levem a mal, eu até gosto da noite, mas tão prolongada...
Quem não imagina o que é a vida numa cadeira de rodas, dir-me-á, como tantos o fazem que eu tenho quem tome conta de mim e me ajude...
AHAHAH, como estão iludidos.
Mas nem é por isso que não estou bem, eu já estou habituada à solidão, ao silêncio, são-me tão queridos como o quente do útero materno...por eles estou protegida.
A falta de companhia, que não seja a dos filhos também não é. Isso é o dia-a-dia.
Então o qu me faz estar tão triste e sorumbática?
A impotência.
Não a física, que nesse aspecto felizmente não tenho problemas, apesar de fazer muita confusão a muita gente que os paraplégicos tenham sexo.
As mulheres paraplégicas que eu conheço têm-no, e até são mães.
Mas a impotência de estar presa, de não ter controle nas coisas, de não poder resolver os assuntos pendentes como o fazia...
É tão chato estar sempre a perguntar ao marido" Olha, já resolveste o assunto dos documentos do carro?" ( Já lá vão quase 5 anos)
E estar à espera de notícias do advogado sobre o processo com o seguro...
E não ter emprego nem estar reformada...
E não ter carro, nem cadeira electrica para sair de casa...
E estar farta destes esfincters que não controlo, desta diarreia crónica, destas dores permanentes, deste mal-estar geral...
Vendo bem, isto são coisas de todos os dias, mas hoje particularmente chateiam-me.
Se eu fosse igual a tantos outros, ia-me deitar e punha-me a dormir. Assim como assim, não posso andar...
Mas eu não. Apesar de tudo insisto na parvoíce de continuar em frente. Há pessoas que dependem de mim.
E eu ?
Estava no outro dia a pensar nas minhas aventuras mirabolantes que tenho vivído desde que estou sentada neste "trono", a pensar na coragem que de facto é necessária para me embrenhar na "selva urbana" e cheguei à conclusão que de facto sou meio alucinada.
Porquê? Porque é muito simples. Já tentaram andar nas ruas das cidades e vilas do nosso Portugal numa cadeira de rodas manual? Não? Eu passo a explicar.
Muito embora tenha saído uma lei em 1997 que regia as normas de acessibilidade ( o decreto lei 123/1997) e que foi revista e alterada pelo decreto-lei 163/2006, praticamente nada foi feito nesse sentido. Está certo que o caminho está aberto, mas não há "descobridores e aventureiros" disposto a navegar nestas novas águas, por vezes tão turvas.
Senão vejamos, edifícios públicos com escadas, sem rampas nem elevadores...Não acredito, dirão vocês...Ah, não?! E os hospitais? E os centros de saúde? E as Câmaras Municipais? E os Tribunais, as Finanças, os cartórios Notariais...Ufa, tudo o que rege e condiciona o nosso dia-a-dia enquanto cidadãos. Ah, e as escolas...1º Ciclo, 2ºe 3º Ciclo, Secundárias...enfim, a lista é tão extensa que me arrepia...
Escadas, escadas, escadas, rampas mal feitas, passeios sem desníveis que permitam atravessar para o outro lado, com largura insuficiente para uma cadeira de rodas, com a sinalética de trânsito colocada mesmo no meio do dito, contentores e ecopontos no passeio, escolham vocês.
E o estacionamento? Ah, está marcado, não está? E ocupado pelos "deficientes sociais"...
E estacionamento em sítios que não têm largura para tirarmos a cadeira de rodas do carro, em que os lancis dos passeios não permitem que saiamos do carro e subamos os ditos passeios, para termos acesso às ruas...
Buracos, empedrados, paralelepípedos em pedra, eu sei lá...mais aqueles brilhantes pinos de cimento que delimitam ruas, estacionamentos e outras coisas que não nos permitem passar...
Como digo, a lista é tão extensa que dou a escolhar a quem quiser por onde começar.
cada vez que me dizem " Devias sair de casa" só me apetece atirar para o chão e desatar a rir...para não chorar.
Ainda não falei de uma terra específicamente, a minha Vila Franca de Xira, mas fá-lo-ei, com exemplos concretos. Eu sei que "Roma e Pavia não se fizeram num só dia", mas convenhamos que já passou muito tempo. E há coisas que não carecem de programas especiais de apoio à Mobilidade para serem resolvidas, só um pouco de boa vontade. E essa parte de todos nós.
Sejamos todos agentes de mudança, peço eu neste pequeno alerta.
Olhemos para o lado ( e para baixo, porque podemos sempre cair no colo de alguém que está " sentado"...)
Sejamos solidários...não custa muito.

quarta-feira, 11 de fevereiro de 2009

Nostalgia...

Nostalgia...

Tenho saudades de mim. Tenho saudades de sentir a areia nos pés, de correr selvagem e livre, de saltar de alegria... Tenho saudades da erva molhada, quando descalça a pisava pela manhã... Tenho saudades de andar na rua, lado a lado, de mão dada... Tenho saudades de dançar...Ah, como tenho saudades de dançar como uma louca, sentindo o suor a correr... Não bebi. Era manhã, e eu não bebia de manhã. Aliás, quase nunca bebia. E era de manhã. Aquela estrada, onde brilhava o sol, precisamente naquela manhã, por onde tantas vezes passei, muitas das quais sem me aperceber do que me rodeava, estava igual a tantas outras manhãs. A música suave tocava no rádio do carro. Suave, sem estridências nem alarmes, mas suave como aquela manhã de Primavera, calma e serena. Fila de trânsito à frente. Há sempre uma fila de trânsito à nossa frente. Mas era uma manhã calma, e com calma parei, à distância dos outros carros, serena, tranquila, quase feliz. E a música tocava suave e eu cantarolava. E respirando fundo, tendo todo o tempo do mundo, puxei o travão de mão. Sim, para quê manter a perna em pressão, quando a manhã estava tão calma e serena e o dia se avizinhava tão pleno de realizações e a fila de trânsito nunca mais andava? E um bébé pequeno mais à frente, na sua cadeirinha sentado, no carro de seus pais, bem lá á frente, porque não quis incomodar e invadir a pacatez daquela manhã, parando o meu carro tão perto do seu. Subitamente o barulho! Um barulho arrepiante, ensurdecedor, assustador, fatal... Um chiar de pneus que tentam aderir e violar uma estrada serena, que irrompe na perfeição da minha contemplação... E eu soube. Soube que nada mais havia a fazer. Naqueles segundos de impotência, não vi a vida a passar diante dos meus olhos, nem flashes dos bons e maus momentos, nem o rosto dos meus filhos... Naqueles míseros segundos eu só vi o bébé que estava á minha frente e fechei os olhos, agarrando-me ao volante na frágil e ténue esperança que o barulho parasse, que desaparecesse... E foi assim que ela invadiu a minha segurança, a minha vida, o meu mundo! Ela, a fonte do ruído, do barulho ensurdecedor, do desespero... Ela, uma carroçaria desajeitada e grande demais para tamanha velocidade, numa manhã tão serena... Não bebi. Nunca bebo de manhã. Raramente bebo. E um dia que seria pleno de trabalho, de realizações, de serenidade, tornou-se simultâneamente o último e o primeiro dia do resto da minha vida... Nunca mais senti a plenitude de um dia cheio de trabalho, do trabalho de que se gosta, que se faz com prazer. Nunca mais voltei a caminhar na praia, a pisar descalça a erva molhada pela manhã, a dançar livremente... Nunca mais fui independente e livre! Naquela manhã cortaram-me as asas e já não consigo voar. E tenho saudades... Tenho saudades de MIM!! Manuela Ralha